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ZANINE CALDAS - PARTE IV


Arquiteto, sem ter cursado faculdade nenhuma, mas com uma experiência inigualável, Zanine nunca aterrou ou alterou solos para construiu uma casa. Uma sala, por exemplo, poderia conter uma rocha imensa que fazia parte da topografia local. Uma árvore centenária por vezes atravessa uma varanda. "No final, é a paisagem que conta... A casa deve estar ligada com tudo aquilo que se encontra ao redor dela, nem deformar, nem violentar. Deve-se parecer como se ela existisse desde sempre." Dizia Zanine em Guimarães Rosa mode on, não? Não à toa Tom Jobim dizia que o melhor lugar do mundo para se morar era uma casa de Zanine.

Ele achava que somente a madeira poderia resolver a penúria de habitação no Brasil. De todos os materiais primários é aquele que demanda menos energia para sua utilização, adaptando-se maravilhosamente à mão de obra pouco especializada local. Ademais, o ferro, o aço, o concreto, o vidro e outros materiais dependem de uma tecnologia maior. (Matéria prima disponível, barata, e de fácil execução, lembram?) Dizia: “Aprendi que a madeira tem duas vidas. A primeira, como árvore, a segunda, como mesa e cadeira, cama e armário, assoalho e vassoura, gamela e colher de pau, casa e curral, berço e caixão.”

Li que “Compreende-se assim este ar radicalmente indígena que se extrai de seus projetos.” Não acho que é só isso. Se suas obras tinham ar indígena é porque não se dissocia um homem de seu imaginário. E pra quem nasceu em Belmonte a tribo está logo ali. Dentro. Da memória.

Construiu uma casa na Joatinga com sobras de madeira que ele conseguia de graça nas construções do Rio. Assim, evitava ter de derrubar novas árvores da Mata Atlântica. Muito íngreme, o lugar antes era evitado pelos arquitetos. "Aquilo era uma pirambeira brabíssima", disse Zanine.

Mas é preciso conhecer o mundo para entender a aldeia em que se nasceu. E Zanine viajou muito. "Ele é o homem mais culto que conheci, não o mais erudito. Ele sabe como o pescador dá nó na rede, como o lenhador corta a árvore, como o índio come. Ele andou e fuçou por todos os lugares. Rodou a Ásia e a África, foi ao Togo, a Daomé, foi ver de onde vieram os negros brasileiros. Dormiu enrolado em lençol, numa praia da Mauritânia, conversou com as pessoas. E ele entende tudo. Outras pessoas vão para esses lugares e não entendem nada", conta o arquiteto Ricardo Caruana, amigo e discípulo.

Discípulos também são os filhos de Zanine, que seguiram o caminho que o pai abriu. (Leia mais sobre o trabalho dos filhos aqui.) Discípulo também é Hugo França. Mas esse é um assunto para outro post. Que esta série já acabou.

E agora, você concorda comigo que quando Zanine morreu, ele não era nada pobre?

P.S.: Hoje a região de Belmonte e Nova Viçosa foi tomada por plantações de eucaliptos, da fábrica de papel Veracel / Aracruz Celulose. Quase não há mata nativa e não sei como ninguém fala em desastre ecológico. Com o golpe militar de 1964 Zanine perdeu o cargo de professor da UnB, tendo sido reintegrado apenas em 1987, mas nunca voltou a dar aulas. Este texto é um patchwork de referências da internet misturadas com a minha memória e meu modo de ver. Esta casa da foto é da Yvone, que me contou nos comentários que sua pousada era um projeto de Zanine.

Fontes: Wikipedia, Museu do Objeto Brasileiro, Istoé, Itaú Cultural, Estadão, Correio Brasiliense, e meu baú de memórias.

Parte I
Parte II
Parte III
ZANINE CALDAS - PARTE IV Reviewed by vivianne pontes on 09:33 Rating: 5

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