OS ANOS 60
O casamento foi em 1962. O quarto foi uma "surpresa" - coisa horrível para uma "control freak". Mas era bonitinho, embora não tivesse personalidade nenhuma. Talvez fosse 'moderno' demais para o meu gosto. Já não era de madeira maciça, meio mogno, com uma 'palhinha' forrando a madeira na cabeceira da cama e dois criados que a ela se prendiam. Muito parecido com o que se vê hoje em lojas populares (é, meu guarda roupa é um desses, 'linda' imitação de mogno, com puxadores que quebram, e portas que agarram no período das chuvas). Tenho nada contra a popularização dos bens, mas o desrespeito é notável, não é? Havia também uma cômoda cujas gavetas foram depois usadas como escada pela menina de pouco mais de um ano para ter acesso aos brinquedos que ficavam sobre ela!... A palhinha se repetia na metade de suas portas do guarda-roupa e em duas gavetas.
A copa era de segunda mão, na verdade uma doação de D. Inesita, (irmã do ex-governador Magalhães Pinto) - uma das pessoas mais doces que conheci, ela e seu marido. Fomos até lá por anúncio de venda de móveis usados. Ela tinha coisas de fazer cair qualquer queixo. Pedi-lhe que não se desfizesse daquelas coisas lindas - mas eles estavam sozinhos, a família queria que fossem para um apartamento. Obviamente não podíamos comprar nada daquelas lindezas, então nos deram a copa - mesa e quatro cadeiras, buffet de duas portas e gavetas no meio, pintados de cinza claro. Usamos por muitos anos - o buffet, minha tia o tem até hoje... E eu tinha amor por eles, nem tanto pela estética (nada especial), mas pelo carinho que eles simbolizaram. Já a sala tinha a minha cara - segunda mão e liquidações: uma mélange fantástica... Sofá cama de solteiro, sem braços, pés palito pretos, couro sintético (ou plástico?) cinza claro com vivo preto; uma poltroninha de estrutura e pés palitos pretos, fofíssima, de lã cinza meio axadrezada; uma estante da Cimo, de sucupira (os livros já começavam a ocupar mais lugar do que as pessoas...), com uma portinha basculante que serviria de "bar". E um abajur de pé, cujo prato refletor mudava de posição (extraviado numa mudança, doi até hoje!...).
Um quadro que eu pintara - uma virgem, ou similar. Mas o mais incrível era um relógio encaixado numa forma de buda em louça, de um mau gosto indescritível, que era preciso exibir por causa da origem do presente... Quando minha primeira filha começou a engatinhar apresentei-lhe a peça numa esperança (vã...) de que a quebrasse para o bem de todos e felicidade geral da nação... Uma mudança, finalmente, deixou só o relógio, sem a moldura horrorosa.
A bebê dormia num moisés de vime, cuidadosamente decorado - embora os parcos recursos - pela mãe, depois, num berço emprestado, de que não me lembro muito bem. Era um apartamento pobre de um estudante e uma funcionária mal paga, mas, tirando o quarto, parecia muito com o que eu queria. Nada extraordinário, algumas peças ganhas, outras compradas com dificuldade. E depois que a menina nasceu, convenci meu pai de que seria bom "para todo mundo" se ele me deixasse construir uma casinha prefabricada no fundo do quintal da nossa casa. Ainda eram os anos 1960, a decoração não havia mudado nada, a não ser pelas camas coloniais para as meninas (agora duas), mas a formatura do estudante nos levou para o interior e a outro padrão de vida.
É, eu sei - não há nenhum entusiasmo. Sinto muito. Eu não posso dizer, a não ser pelas meninas, que foram tempos bons, e não por causa da falta de recursos... - e havia uma ditadura se instalando, ainda por cima... Quem sabe os anos 1970s terão um pouco mais de cor?
Bjs, Vania
♥ D. Vania, hoje professora aposentada de inglês e português (com direito a canudo e tudo...), foi antes secretária executiva bilíngue durante eras. Por duas vezes começou e abandonou a Escola Guignard, mas ficou o suficiente para conhecer o melhor da arte. Tem 4 filhos, três além-mar, uma à beira-mar, na Paraíba. Divorciou-se dos pincéis há muito, mas continua apaixonada por coisas bonitas, por feituras inusitadas e por gente linda!
OS ANOS 60
Reviewed by vivianne pontes
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