#fikdik, #quemnunca? #6
Por Carolina Mendes
Acabei de me mudar.
Sim, pra um apartamento de pé direito alto, e chão de taco. E nenhuma parede de textura. Na sala de jantar , nada de lustre esquenta marmita.
Vivendo de acordo com o que eu prezo.
Assim que deve ser, cada um vivendo de acordo com o que valoriza, dentro do que pode pagar. Se não pode pagar e odeia, que saiba rir da situação.
Enfim.
Aí você se muda e passa a viver soterrada por caixas, até que num esforço sobre humano derrota um número suficiente delas pra que o ar passe a ser matéria dominante. De 283 para 75 caixas em 1 semana, já é possível viver. Claro que, vira-e-mexe alguém se pega revirando as 75 atrás de algum controle remoto perdido, mas em linhas gerais tá tudo bem. E a vida volta ao normal e você passa então a adicionar humanidade, amigos e parentes na mistura.
Fui educada para acreditar que sempre que se vai à casa de uma pessoa pela primeira vez, é de bom tom levar um presente. Isto vale para a primeira vez que se visita a casa nova de alguém. Uma besteira, um regalo. Qualquer bobagem, mesmo.
Normalmente pelo gesto e não pela grandiosidade material.
Aí que as pessoas, bem educadas começam a trazer presentes pra casa, e eu me vejo além de sabotada pelas últimas 75 caixas, sabotada pela formação de um contingente de coisas e cacarecos que formam a tralharada com que eu terei que duelar na próxima mudança.
Todo tipo de crochês e variantes, petisqueiras em forma de morango, faquinhas pra queijo com cabo decorado, conjunto de tapete em "U"pra base do vaso sanitário com capa pra tampo do assento combinando, capa de eletrodoméstico, vinho barato, bibelô de cristal Swarovski, toalhas de mesa com estampas medonhas, jogos americanos daquela palha grossa e ondulada que deixa o copo tortinho. Taças de vinho (4) de vidro gorsseiro e pé preto, toalha da bandeja descartável, capa de eletrodoméstico, pintura a óleo de natureza morta com gatinho, porta retrato de mosaico, tapeçaria bordada a mão. Conjunto de jarra para suco com copos combinando, panela de fondue, formas de cupcake, odorizador de ambiente.
Coisa de louco como nessa coisa de decoração e casa as pessoas desconsideram completamente o que conhecem de você e simplesmente compram qualquer coisa pra cumprir protocolo, ou algo que elas gostariam de ter mas não têm porque é completamente inútil. Porque não se fez necessário no dia-a-dia, mas como é um presente pra casa do outro, passa a ser algo relevante.
Sério, me tragam flores. E ponto. Quero mais tranqueira não, acabei de esvaziar a vida de tranqueiras pra fazer a mudança. Acabei de entrar leve e sem cacarecos na casa nova. Mas o mundo me testa e me faz voltar a ter que lidar com esse tipo de coisa.
E as 75 viraram 77 caixas.
♥ Carolina Mendes é paulistana, escritora e implicante. (Foto Creature Comforts)
#fikdik, #quemnunca? #6
Reviewed by vivianne pontes
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20:46
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